Os muros da quinta dos teus avós maternos caíram há três invernos e nós ficamos a ver pela janela, como se o mundo desabasse, como se o mundo estivesse a acabar. Não acabou, e eu fiquei a ouvir-te em murmúrios com os teus avós pela porta, a família dos outros é sempre dos outros, nunca a nossa. Nunca gostaram muito de mim, os teus avós. Eu também não gostei muito deles, mas de ti o meu coração sempre teve cheio. Uma dor imensa a de amar de verdade, porque os outros, nunca são nossos. Tu nunca foste meu, apesar de as minhas tentativas, dos fins de tarde e dos teus e-mails quando estiveste a viver em Madrid. Tu sempre me empurraste, te sentaste longe no sofá, e eu apanhei os teus hábitos e no fim, não havia nada mais que um espaço entre nós que os outros olhavam, e por fim, um ou outro ocuparam.
Havia dias que me ignoravas. Que a minha existência era mais uma companhia que alguém de verdade e eu deixava, eu deixei. Os outros olhavam-me, os mais chegados às vezes:
- Merecias melhor, não?
Mas eu a achar que era feitio teu, que era culpa minha.
Os muros da quinta dos teus avós maternos caíram há três invernos, a água e a lama entraram na piscina, derrubaram a mesa onde almoçávamos e destruíram as vinhas. E nós ficamos a ver pela janela. Como se o mundo fosse acabar. Eu dei-te a mão, e a tua mão estava fria na minha.
Os outros nunca são nossos. E eu descobri uma maldade dentro de ti que tu te orgulhas, eu encontrei uma maldade dentro de ti que abriu fendas entre nós. Os outros nunca gostam de ser nossos. Tu nunca aprendeste que não há outra cura para além de ser de alguém. Esta é a minha carta de despedida, despedir-me das vezes que me fizeste rir, que me entendeste, dos fins de tarde com um cigarro nos dedos, e dos dias de sol na quinta dos teus avós. Despedir-me dos dias em que me viraste a cara, que te sentavas na outra ponta do sofá ou que arrancavas com o carro cedo de mais.
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