quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Tranisto Intestinal


As saudades são transito no teu corpo,
Ultrapassam-te o sangue,
Atropelam-te os órgãos,
E insultam-te as células.
Meu amor, meu mísero amor.
A falta que não me fazes espanta-me.
Tanto amor que desapareceu. Morreu.
Tanto amor.
Ele pareceu-me eterno, imortal,
Mas, por estes dias, já lhe perdi o rasto.
Os teus olhos,
Sabiam-me a oceanos,
Mas, no fim, tornaram-se aquários.
Minúsculos aquários.
Não sei onde estás e o que é da tua alma.
Alma que foi um dia tão grande.
Imensa, de uma profundidade aliciante.

Mas, no fim, era só um poço.
O teu sorriso roubava-me, matava-me.
Isso não mudou, só a forma como o fazia.
Eu disse-te, eu pedi-te para não te perderes.
Mas tu disseste-me que te perdeste no momento em que te cortaram o cordão umbilical.
Mas isso é mentira meu amor.
Eu conheci-te antes de aterrares nesse teu universo.
Eu conheci os teus olhos oceânicos e a tua alma crescente.
Eu conheci as tuas alegrias e amparei-te as dores.
Diz-me que sim, diz-me que eu o fiz.
Garante-me que estes anos que me pesam no peito foram amados também por ti.
Diz-me.
Se soubesses a dor que as tuas viagens universais me trazem, não as farias.
Porque tu também me conheceste antes deste presente e das promessas deste futuro.
E apesar do nosso amor se ter esgotado.
Ainda tens dentro do teu armário as minhas cartas,
As provas da existência do nosso amor.
Colossal amor.
Eterno amor.
Ele deixou-se ficar dentro do teu armário e adormeceu em nós.
Não te mates, meu amor, não te mates.
Porque, para cadáver já cá estou eu.
Luzes azuis e luzes vermelhas acendem-se em mim.
Deus ouve-me por favor.
Leva-as de mim, fá-las desaparecer.
Ouve por uma vez.
Tira-as de mim.
Eu sei, e a idade faz-me compreender, que tu não podes fazer ninguém ficar.
Mas podes leva-las.
Isso eu sei, toda a humanidade sabe.
É um dos teus muitos trabalhos.
Ouve-me por uma vez.
Eu preciso de ajuda.
E eu reconheço-me fraca mas eu não sei que fazer ao meu corpo.
Eu sacrifico-me por mim mesma e por o que me espera,
Mas eu preciso de apoio e de oxigénio.
Deus, o meu mínimo amor fugiu-me.
E a solidão engasga-me.
Leva-las de mim, porque elas não me pertencem.
Se tu me procuras, procura-me nos sítios onde as minhas memórias residem.
Porque o que resta de mim não vale a pena ser encontrado.
Faz-me companhia.
Eu sei que nós não já não somos o que fomos.
Mas não te mates, meu amor, não te mates.
Porque mesmo com todas estas feridas que me destes,
Eu preciso dos teus olhos, mesmo que eles sejas apenas aquários.
Porque eu tenho uma imaginação enorme, e eu vou conseguir imaginar neles os oceanos que já secaram.
De vez em quando, eu vou conseguir imaginar neles o que neles lhes falta.
Meu mínimo amor, menti-te quando te disse não te sentir falta.
Eu tenho saudades tuas.
E as saudades são trânsito no meu corpo.

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