quarta-feira, 30 de agosto de 2023

Mensagem 294

 


Há alguém novo,

Na minha cama,

Dentro do meu coração.

Tem a voz grossa e as mãos fortes,

ele pede-me que

- Fala comigo.

E eu não sei como lhe dizer que tenho medo que se eu falar,

Ele veja,

Que eu sou frágil.

 

Eu gostava de lhe dizer,

Que o meu coração treme sempre que ele aparece,

mas não encontro as palavras,

e tenho medo que ele se assuste,

e de repente,

eu sou um arrependimento.

Algo que ele esquece.


Os dias passam. Será que ele sabe?

sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Mensagem 293


Pode ser que não seja mais que isto:

Eu e tu tivemos o amor,

na mão

E não soubemos o que fazer.

Mas quisemos e tanto.

Foi tão dolorosamente fácil,

como se nos tivessem dado um barco no meio de uma tempestade

e soubéssemos exatamente como remar.

Sem plano ou direções

mas com o instinto a ir para o lado certo.

E tu remaste sempre,

mesmo quando eu não via as ondas e

quando o nevoeiro me impedia a vista

tu apontaste-me o caminho.

E ás vezes, por vezes,

eu devo ter deixado entrar água

e tu com os pés encharcados sacaste de umas galochas.

E assim fomos indo a sítios,

vimos cidades

e comemos o mundo.

E eu acredito que também vesti as minhas galochas,

que as saquei de dentro de mim,

de então desse amor.

Que sempre ouvi falar,

e que agora sei o que é.

Contigo. Na tua barba e nos teus olhos.

E de repente, o nevoeiro chegou a ti.

E eu não sei, não sei,

uma onda talvez.

uma baleia então,

talvez foi o vento de norte.

Ou tudo. 

E o barco virou.

E as cidades que vimos agora estão em fotografias,

E eu tento-me lembrar do que foi ter os meus pés nas praças delas, 

Mas os meus pés doem porque não se lembram.

São fotografias de uns pés.


Então debaixo do barco,

numa bolha de oxigénio,

entramos em pânico.

Tu apontavas para cima.

Eu para o fundo.

Eu para a direita,

Tu para a esquerda.

E os teus olhos e a tua barba, 

menos meus.

E a verdade é que com isto da tempestade,

eu não tive o tempo que queria para te ver,

para me perder em ti.

Como merecia.


E na bolha de oxigénio,

vimo-nos pela primeira vez.

Naquilo que não gostamos de ver ao espelho,

a parte de nós que não é nossa,

que já estava aqui quando nascemos.


E como se tivéssemos sido resgatados,

fomos largados na praia

onde começamos.

E olhar para ti, 

a procurar quem tem mais cicatrizes,

não vai levar a lado nenhum.

Por isso, eu vou indo.

Eu lembro-me de ter uma cabana nesta praia,

não sei bem onde estão as chaves.

Eu gostava de te convidar a entrar,

mas eu sei que tens que ir.

Já é tarde, o sol já se pôs,

eu queria-te arranjar o cabelo,

puxar-te o lençol.

Mas parece-me a mim,

Que devo aceitar o naufrágio, e entender que o capitão vai ao fundo com o barco, porque não se pode ser capitão de um barco afundado.


Eu entendo que quisesses afundar o barco, não precisavas de o afundar comigo dentro.