segunda-feira, 18 de agosto de 2008

You gotta go there to come back


Tudo acabou antes de começar,
E eu estive mal nas brumas das luzes,
Mas tu afogaste-te em palavras,
Palavras que brotavam do chão como flores,
Palavras que nasciam do cimento preto, não podiam ser boas palavras.
E, de facto, não eram, fizeram-me chorar como uma criança,
Sangrar como se balas fossem.
Desde que tu partiste, agarrei-me aos livros como só um tolo consegue.
Apaixonei-me pelas personagens e faço delas companhia.
Rebolo-me pela cama, num embalar que está longe de o ser.
Passo dias sem dormir, desde que tu partiste.
Atravesso as noites contigo na ponta da língua,
Com o teu nome no umbigo.
Hoje percebo que tu nunca me amaste,
O amor que me deste não era mais que tristeza pintada e enfiada num sorriso.
Mas isso não me impediu de o aceitar de alma aberta.
E eu tê-lo feito com tanta cadência é o mais triste, é o que me mata e tira o sono.
Metade das pessoas que eu amei, não me amou.
Apercebo-me disso com a boca seca e o corpo dorido.
Metade das pessoas que me amou, eu não amei.
Apercebo-me disso com um peso no peito, e frieiras nas mãos.
Sou uma criança que não sou e não choro a nostalgia nunca minha porque as lágrimas secaram do meu ser.
Mas quando o fizer, chorarei mares e oceanos,
Onde então tu te possas afogar.
Onde tu possas aprender o que significa partir um coração.
Talvez, quando eu o fizer irei, finalmente, limpar a alma suja que me mancha o corpo.
Tu disseste-me doente,
E eu até posso ser menos elegante, menos preocupada e mais preguiçosa que tu.
Mas nunca, em altura alguma, fui tão egocêntrica, convencida e apática como tu.
É triste que nunca me tenhas amado,
Terias ficado em mim como algo bom na eternidade dos séculos.
É, de facto, triste.

domingo, 17 de agosto de 2008

Over ghosts

These are just ghosts that broke my heart before I met you

Mata-me


O teu corpo vestido de preto ao meu lado.
Pronta para morrer, dizes-te tu.
Os teus dedos frios e pálidos a procurarem os meus – uma última vez que é também, de certa forma, uma primeira vez –
Um sorriso cresce nos meus lábios:
A tua morte a fazer-me de companhia,
E pela primeira vez em anos eu sinto-me em boa companhia.
‘Eu admito, menti-te’, digo-te num sussurro que é berro d’ alma.
Menti-te não uma, mas mil vezes, não sou quem tu me achas e o meu nome tem mais duas vogais do que aquelas que tu contas.
Menti-te, e hoje, não me arrependo.
O teu corpo a morrer sentado, velho sem o ser,
Imundo como sempre foi, mas tu sempre o escondeste.
Mas o sangue não sai com água e sabonete
E, por isso, as tuas pupilas e unhas são vermelhas vivas.
O teu corpo a honrar o teu próprio luto,
Não tens medo da morte, mas tens medo que só o Diabo te abra as portas.
Estás a morrer e eu olho-te,
Não me dói,
Não me sufoca,
Nem sequer me comicha.
Vais morrer, amiga minha, já não era sem tempo.
E eu já imagino o teu corpo frio e hirto,
E a saudade a que tudo se vai resumir,
As memórias que não hão-de falar, porque já perderam a voz.
Minha mais querida amiga, estás a morrer. Ouves-me, agora?
Vais ser comida dos insectos que tanto odeias,
As baratas vão rastejar pela tua pele, e comer-te, comer-te
Comer-te,
Comer-te.
Até tu desapareceres.
Os teus dedos desmaiados a procurarem pelos meus.
Porque não vieste antes?
No dia em que eu te pedi a mão?
Menti-te minha puta, quando disse que não fazia mal.
Tu mentiste-me quando me disseste querer bem, quando me pediste para acreditar em ti, mentiste-me, traíste-me, feriste-me.
Morre num luto que eu nunca farei,
E eu chorarei a tua morte como se da minha se tratasse, mas só uma vez e porque fica bem.
Fica sempre bem chorar num funeral.

Ouve-se um (último) suspiro.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

I can't wait


Está tudo na forma como fomos educados, como as nossas mães nos embalaram à noite, como os nossos pais diziam o nosso nome. Está tudo no facto de eles terem feito isso ou não. Se o fizeram por verem os outros fazer ou se por instinto.
Nisso tivemos os dois sorte, os nossos pais sempre nos pegaram pela mão, e talvez o facto de termos tido uma educação semelhante juntou-nos. Por outro lado, pode ter sido os teus grandes olhos castanhos e a minha paciência a faze-lo.
O que nos separou é que eu não sei dizer, foi tudo, foi até a nossa educação semelhante, os teus grandes olhos castanhos e a minha paciência.
Foi o facto de eu ter que lavar a louça sozinha, e tu não saberes guardares palavras. Foi o facto de só saberes falar de ti, e eu não saber quem sou. Foi o facto de tu nunca fazeres nada por mim, e eu não ter nada para te dar.
Podia-te dizer que podemos continuar a ser amigos da mesma forma, que tu me podes telefonar a contar o que comeste ou deixaste de comer, que podes voltar a entrar em minha casa ás duas da manha a chorar porque a tua mãe não é a mulher que tu gostarias que ela fosse. De certa forma, eu também não sou, eu sei-o, e eu própria não gosto da mulher que sou. Mas alguns dos meus defeitos são incorrigíveis e uma coisa que tu nunca me poderás acusar é de não os tentar corrigir, apagar, matar. Tu, melhor que qualquer pessoa, sabes a guerra que eu travo comigo própria – todos os dias – sabes que eu tento e rezo para ser perdoada. Mas tu também sabes que é difícil contigo ao lado, tu és perfeito em todas as medidas, tens sempre a postura certa, tens sempre as mãos limpas, o riso certo, os olhos grandes e abertos, a voz no timbre, a mão no pincel, a matemática na boca, e o cigarro nos dedos certos. Eu sempre fui um desastre: queimo as pestanas, rio-me quando a piada não está presente, e preciso de tempo para fazer contas de cabeça. Mas eu sempre pensei ser um desafio para ti, ser engraçada na minha descompostura, na minha falta de tudo, mas hoje sei que comigo ao lado tu simplesmente parecias melhor. E tu sempre gostaste de ser o melhor.
Não digo com isto que não te amei de uma forma quase doentia, porque tu sabes que eu o fiz. Amei-te com todas as forças do meu ser, amei-te como nunca amei outra pessoa e duvido que alguma vez ame alguém de uma forma tão possessiva e inocente. O meu amor tinha o formato de uma tempestade e era mais vasto e mais sedento que um deserto. Eu era tua como um só um cão pode ser, eu era tua como só uma mãe pode ser, eu era tua amiga, tua companheira, tua. E eu disse-te isso, não disse? Disse-te enquanto lanchávamos, disse-te em cartas, disse-te em silêncio e disse-te em toque, mas tu nunca me entendeste. A verdade é essa, tu nunca entendeste o quanto eu era tua.
Tu, tu nunca foste meu. Tinhas sempre alguma coisa acima de mim, o trabalho, a família e um ou dois amigos. Não é que eu duvide que tu gostaste de mim, eu sei, porque uma mulher entende estas coisas, mas tu nunca foste meu. E ser de alguém é algo divino e não humano. O teu corpo nunca vomitou uma necessidade minha, nunca me quis incondicionalmente. Eu sempre quis mais de ti, mas como é que eu te posso pedir mais? Pedir mais amor, não é o mesmo que pedir mais dinheiro ou mais comida. Eu não me posso sentar à tua frente e dizer-te que preciso que me ames mais. Não sou esse tipo de mulher e tenho inteligência suficiente para saber que não se pode pedir amor a ninguém. Tu dás-me o que queres e o que consegues, e se essa quantidade não me é suficiente então o mal é meu. O mal é e sempre foi meu, por te ter dado mais do que tu me deste a mim. Por ter posto demais na primeira parte da equação.
Ter deixado de te amar, não foi uma coisa fácil nem premeditada, aconteceu aos bocadinhos, nas entrelinhas das tuas frases, na tua preguiça comigo, de nunca me perguntares “e tu?”, de não gostares de animais, de nunca pensares se eu seria feliz, mas principalmente, na dor que os teus grandes olhos me trazem. Eu sempre me olhei com pena da pessoa que me tornei, e o dia que eu reconheci esse olhar em ti foi o dia em que eu já não te soube amar. Os teus grandes olhos castanhos que me fizeram um dia apaixonar, foram também o que me matou. A ironia da vida tem destas coisas. O meu inerente karma.
Tivemos muito tempo juntos, e muito tempo, bem, é muito tempo. Não há maneira de o negar ou ignorar, sobretudo porque eu te amei de uma forma completa e prometi faze-lo até morrer. E, apesar de não parecer, ainda estou viva.
Assim, eu continuo parte tua: a lavar-te as lágrimas e os pratos. A rir-me sem medida, a não saber fazer nada bem e tentar ser metade do que tu és. Não foi sempre assim, mas agora é. Houve uma altura em que eu me abria para ti como só um ser humano sabe fazer. Houve uma altura em que tu me fizeste tão feliz que eu duvidei se tu não serias fruto da minha imaginação. Em que me deitavas a cabeça nas tuas pernas e rias-te das merdas que eu dizia, em que me abraçavas de manha e á noite, em que me beijavas com uma força doce, como só quem ama sabe fazer. Mas essa parte nossa morreu em algum lugar, e estas palavras são para lhe dizer adeus, para dizer a mim própria que essa parte nossa não está dentro de nenhuma garrafa de vinho ou vodka nem em estrelas cadentes. Acabou, morreu. Não vou chorar, porque não preciso de o fazer. E chorar é uma questão de precisar e não de querer.