quarta-feira, 9 de janeiro de 2008


Isto é em honra do passado, porque eu penso que até ele merece um funeral,
Algo que o faça sentir querido, amado.
Até ele.
Isto é em honra de todos os maus dias,
Em honra de tudo que me fez ser quem sou,
Estar onde estou.
Isto é em tua honra.
Trazes-me dor ao peito,
Transformas-me em dor e gelo.
E o verdadeiro mal não é o fazeres, mas sim, só tu o conseguires.
Hoje, é em honra dos tempos perdidos,
Das horas mortas,
Da monotonia.
Pois ela foi minha companhia constante
E nunca me deixou sozinha.
Hoje escrevo em honra do que nunca chegou a ser ‘coisa’.
Do que morreu no caminho,
Das palavras que se esqueceram em lado algum.
Em honra de todos os ‘quases’.
Quase toques, quase verdades.
Hoje é em honra de todas as mentiras.
Todas.
Às que foram descobertas, ou ás que ainda dormem ao meu lado.
Porque sem elas, nada seria o que é.
E isso seria uma pena, certo?
Hoje é em honra de todas as maldades que se espetaram nas minhas costas,
Nos meus pulmões, nos meus olhos e nas minhas pernas.
Isto é em honra de toda a infidelidade que eu encontrei nos meus dias, e me roubaram o sono à noite.
Hoje é em tua honra.
Isto é por todas as orações abandonadas,
Pelas mudas,
Pelas desesperadas
E pelas feitas em nome de outros.
Isto é pela esperança que elas tenham sido ouvidas por um Deus empregado no mundo divino.
Isto é pela esperança.
Isto é pelas estações do ano,
Pelo movimento de translação,
Pelas horas e milésimas de segundo.
Porque, no final, todos contaram.
Isto é em honra do esquecimento e da saudade.
Deus, pela saudade.
Porque a saudade foi a minha outra companhia constante.
Ainda o é, e duvido que algum dia me abandone.
Por tudo o que eu esqueci e por tudo o que me esqueceu.
Isto é pelos ‘velhos tempos’,
Pelos sorrisos cúmplices,
Pelos privados,
Pelos não sentidos,
Pelos sagrados,
E pelos que matam.
Isto é em tua honra.
Isto é em honra de tudo o que me arrependo.
Das lágrimas e do desespero.
Pelas sextas à noite, ou pelos sábados de manha.
Isto é em honra dos ares intoxicados e dos cheiros desconhecidos.
Do que eles me trouxeram, mas também pelo que me tiraram.
Isto é em honra da solidão.
E do peso que só ela me consegue trazer.
De todos os momentos que me apercebi que ela tinha chegado.
Em honra de todos os acordes e melodias.
Todos aqueles em que eu caibo.
Todos aqueles que fazem parte da minha voz.
Em honra daqueles que me foram mostrados a medo ou dos que eu procurei.
Todos.
Isto é em honra de todos os amigos.
Meu deus, em honra de quem eu amei e confiei.
De quem me amou e em mim confiou.
Em honra de quem, comigo, se riu sem fim.
De quem me desejou boa sorte,
De quem me abraçou e ao mesmo tempo prometeu nunca se esconder.
De quem cumpriu a promessa, de quem não o fez.
Estou cansada, por isso, tanto me faz.
Isto é em honra de quem se transformou noutro alguém qualquer.
Num super-homem ou num shrek.
No fim, só interessa se fomos quem quisemos.
Pelos ‘adeus’,
Pelos tardios ou antecipados,
Pelos mal pensados,
Pelos sentidos ou banais,
Pelos que realmente queria,
Mas principalmente,
Pelos que eu nunca quis.
Nunca.
Por todos os ‘nuncas’, ‘jamais’,
‘sempres’.
Hoje é em honra de todos os natais,
De todos os aniversários,
Todos os dezasseis.
Em honra da contagem decrescente,
Dos brindes e das velas.
Em honra da família,
Mesmo aqueles que nunca conheci mas que são a razão de eu ser um seres vivo.
Pelas coincidências – tristes e alegres.
Pelas ironias,
Pelas metáforas,
Pelas anáforas.
Por todo o exagero que me assustou ou me alegrou.
Por toda a espera a que fui obrigada,
Por ter sido obrigada a esquecer a minha impaciência.
Por todos as palavras que quis e mereci ouvir,
Mas nem me chegaram perto.
Por todos os sentimentos que não têm nome mas vivem em mim.
Por todos os meus sacrifícios,
Por todas as minhas tentativas de ser e estar de forma diferente.
De forma melhor.
Pelos meus ídolos,
E tudo a dor que eles tinham agarrada aos poros da pele.
Aos beijos perfeitos e a todos os outros.
À dor sobrenatural no coração.
Á perda de ar. À que nos faz renascer e à que nos mata.
Ao ‘e se?’ que me corrói todos os dias.
Ao céu, inferno e todas as outras lendas.
Em honra de deus e o seu enorme sentido de humor.
Á morte.
Que tem em mim o mesmo efeito que a lixívia,
Tira tudo, mesmo a cor.
Ao que morreu em mim, ao que morreu na terra, ao que morreu em segredo.
À vida.
Ao presente, ao futuro.
Deus, ao passado!
Ao que passou e não volta.
Porque até ele merece um funeral.
Até ele.
Isto é em tua honra.

2 comentários:

Inês Viterbo disse...

Como estás tu, Inês? Conta-me da tua vida!

Fico feliz por me ires reconhecendo no que partilho.

Marta Madureira disse...

Eu ia destacar algumas frases que amei só, mas depois vi-me a copiar quase todo o texto para comentar, portanto percebe que este é o que eu mais gosto! A serio.
Saiu-te das entranhas e passou para a minha pele! Amo-te Ines Regalado