sexta-feira, 26 de setembro de 2008

onze e doze


Paris, 11:12 da manhã, 2008

Ele aproximou-se, com os passos apertados e as mãos nos bolsos para se proteger do frio de Janeiro. Ao pescoço trazia um cachecol enroscado e as golas do casaco comprido levantadas. O cachecol tinha-lhe oferecido ela.
Ela já o esperava com os braços cruzados no peito para o calor não se dispersar e o nariz vermelho. Tanto a respiração dela como dele erguia-se no ar como uma nuvem, como se a alma estivesse a fumar.
- Onze e doze da manhã, precisamente. – Disse ele ao mesmo tempo que tirava o pulso direito do bolso a custo e espreitava o relógio. – Tal como pediste. Porquê que tinha de ser precisamente ás onze e doze da manha?
- Porque é a minha hora. – Respondeu ela, saltando subtilmente para se aquecer. Ele não respondeu, em vez disso, deitou um olhar afastado ás pessoas que passavam pela praça, agachadas no próprio corpo. Por isso, ela continuou:
- É esta a minha hora da sorte. Sorte ou outra coisa qualquer – Explicou – É nesta hora que me acontecem as grandes coisas, tanto más como boas. – Fez uma pausa, e esperou que os seus olhos se encontrassem. - Foi nesta hora que nos conhecemos.
Ele olhou-a:
- Conhecemo-nos exactamente ás onze e doze da manhã?
- Mais coisa, menos coisa.
Ele assentiu como quem entende, mas com a expressão de quem não entende, de quem não se quer, sequer, dar ao trabalho de entender:
- E para quê que precisas de sorte? O que é que me querias tanto dizer?
- Casa comigo.
- Agora?
- Se quiseres pode ser agora, não me importa, mas não tem de ser justamente agora.
Ele olhou-a lentamente, olhou-lhe os pés e depois os próprios pés. A sua expressão que se tinha tornado pesada abriu-se num sorriso sarcástico.
- Caso contigo? Caso contigo. – Fez uma pausa para respirar, para se rir, para pensar. – Terça-feira dizes-me que estás de viagem marcada para Londres, quando eu te pergunto onde é que eu entro nessa história tu dizes-me que eu não entro, a história é tua e só tua. Depois ligas-me ás três da manha a grunhir para eu estar aqui ás onze e doze, exactamente, da manha e pedes-me para eu casar contigo? Viras-te maluca?
- Eu sei, e desculpa-me. Fui egoísta. Egoísta de uma forma que nunca tinha sido ou pensado ser. Magoei-te, e isso magoou-me a mim. Menti-te.
- Mentiste-me? – Ele exaltou-se: quando? Porquê? Foi com aquela besta da agência dela, ele sabia.
- Quando te disse que a minha história era só minha.
Ele rodou nos pés, irritado. Ela disse:
- Casa comigo. Por favor.
- E vivemos em Londres…
- Podemos viver em Londres, podemos viver aqui, podemos viver na China.
- Sabes que um pedido de desculpas bastava? Não precisavas de…
- Eu sei. – Interrompeu com ansiedade latente na voz. – Mas eu quero-me casar contigo. Eu quero envelhecer a teu lado, acordar todos os dias a teu lado, viajar a teu lado. Ter os teus filhos. Ter-te. Ser quem e como os nossos pais são.
Ele engoliu em seco e os músculos da cara contorceram-se. Ela continuou:
- Por favor, não me faças fazer figura de louca.
- Tarde de mais. – Fez uma pausa e então:
Sorriu (-lhe):
- Eu caso contigo se tu casares comigo.

Paris, 11:32 da manhã, 2008

2 comentários:

Anónimo disse...

é de algum livro? ou são palavras tuas?

Anónimo disse...

Lindo , até chorei :')