sábado, 3 de janeiro de 2009

Give up


Nos ventos que tu fingiste sempre não sentir,
Eu fui, perdida ou por perder.
Como se o meu corpo não fosse corpo, mas casca,
De uma alma que nunca acertou,
Nunca escreveu na mesma linha.
E tu sempre fingiste não me ver,
Até o sempre ser tempo demais até para ti,
Ser tempo de trazer rugas, olhos cansados, tempo estagnado.
Em que as horas passavam por ti, por mim, e quando foi o meu tempo tu não me deixaste tocar.
A tua inveja que me roubou vida,
Mas o que é que isso interessa agora?
Tu não me podes dar de volta, e as desculpas não servem de nada ao fim do dia.
Nem se quer me entram no bolso, nem se quer me aquecem o meu peito gelado.
Que boa forma de começar um ano,
Um ano que eu não quero, porque não vai ser meu
- Porque nunca nada é meu –
Que não me vai caber na palma da mão, porque vai ser sempre dor a mais.
Que falta de espírito, de atenção que eu carrego,
Como se o meu corpo, que afinal é casca,
Como se a minha alma, que afinal é agua,
Fossem parte de algo esquecido.
Pior, nunca lembrado.
Por ti, por todos.
Erro, por todos não, porque o meu pai nunca me esqueceu e sempre me disse:
- Fofinha.
E eu sempre me soube como
- Fofinha.
Mas eu não sei onde a
- Fofinha
Dele está. Porque eu deixei de a ser, porque os anos nunca são meus, eles passam por mim e eu vejo-os nos rostos que nunca quiseram ser meus. Mas os anos nunca são meus, e este nunca há-de ser algo bom, porque o bom nunca tem o meu nome assinado.
A insónia que tu foste em mim, manteve-me viva, nas ilhas em que tu me fizeste, nas marés, oceanos e dores em que me perdeste, porque talvez nunca me tenhas encontrado.
E sejas só mais uma das minhas mentiras.
Mas o meu pai nunca se esqueceu do
- Fofinha
Que carrega na voz. E nesta nação de dor, em que a bandeira sou eu, estamos todos de luto, não pelo passado, mas pela falta dele. De eu ter de sobreviver, sempre, sobreviver. Nunca viver.
Talvez, pai, fosse mais fácil se te esquecesses do
- Fofinha
Porque é a única coisa que me mantém viva. A única que eu ainda sei como minha.
Mas não há ninguém por aqui, porque sou uma ilha, onde nada acontece, que ninguém se lembra. E por vezes alguém naufraga em mim, e as feridas que eu lambo, as dores que eu curo são esquecidas pela vontade de fugir. De viver.
Vontade que eu um dia tive, (talvez quando eu era na verdade a
- Fofinha
Que tu me dizias) mas desapareceu-me das veias, e quando o meu coração se recorda de mim, bate com a dor que a falta de uso o obriga.
E quando um dia ele adormecer, esquecido da insónia que só tu uma vez – há tempo demais – me deste, quando ele adormecer numa ausência completa, num fim deserto, sem retorno, sem respostas, a minha casca seja deixada aos bichos, ignorada porque de nada vale. A minha alma não irá a lado algum, presa nos contornos que nunca viu. Nos erros que o amor deu, no ditado que ela nunca ouviu bem, porque estava na última fila. Sempre na última fila.
E talvez, com o tempo tu também, pai meu, te esqueças da
- Fofinha.
(porque na verdade ela também já se esqueceu) e talvez assim eu encontre a solução que eu já conheço faz séculos. E talvez assim a minha ilha se afunde, mas não faz mal, porque nunca ninguém se quer soube que ela existiu.
É ano novo, mas não vai ser meu, porque nunca é. Porque eu sou uma ilha num oceano virado para o infinito. Sou uma ilha minúscula, onde a minha dor bate nas rochas, noite e dia.
Mas ninguém se lembra de me vir habitar, ninguém se lembra de vir amar. É ano novo, mas eu tenho medo. Eu tenho medo e não é, juro-te que não é, porque tenho alguma coisa a perder. É só medo. No estado mais puro, mais sentido.
É ano novo, merda.
Pai, por favor, é ano novo, e eu não sei se tenho mais forças, não sei se a minha pele aguenta mais chagas. Pai por favor, deixa onde estava a
- Fofinha
Que eu já não sou.

(No entanto a minha gratidão é eterna, não penses que a culpa foi ou alguma vez será tua.)

1 comentário:

Anónimo disse...

Sempre os grandes textos :)

És a mais especial.

Love you, e amnaha vou matar as minhas SAUDADEEES *